Manuseando sua cadeira de modo lento, o rapaz andarilhou pelas ruas quietas e silenciosas do Redemoinho. Correu seu olhar diversas vezes pelos altos prédios, na esperança de reconhecer algum deles, ou encontrar qualquer coisa que lhe desse a mínima pista do significado de tudo aquilo. Por mais que tentasse, não encontrava nada em sua mente além da confusão e cansaço. Mas cansaço de que? Por que sentia-se cansado de tudo? Por que sentia que as memórias de quando esteve à beira da morte eram uma oportunidade? Olhou para o estrelado céu, vendo que já era noite, e permaneceu ali, se perguntando para onde deveria ir. Qualquer um diria casa; mas onde é a casa de alguém que sequer sabe quem é? Conduziu sua cadeira para um local mais ao fundo do vilarejo, onde havia uma edificação antiga, abandonada, com rampas de acesso para a parte mais alta. Subiu a mesma, e parou sua cadeira na beira do prédio velho. Seus olhos correram silenciosamente pela noite estrelada, tentando contar a infinidade delas no céu, inutilmente. Sua mente, por um instante, achou um alívio que não sentia desde que havia acordado. Parecia um profunda sensação de paz e conforto, como se soubesse que tudo realmente iria ficar bem. Fechou seus olhos e deixou o vento tocar seu rosto, balançando seus cabelos.  

- Já faz algum tempo… minha criança. - Disse uma voz estranhamente familiar, que parecia vir de perto.

Diferente do que se esperaria, a reação não foi brusca ou abrupta; o rapaz simplesmente abriu seus olhos e levantou o rosto. De alguma forma, sabia.

- Masa...mune?

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O silêncio repentino no local causava uma certa tensão no ar, mas nada que fosse capaz de afetar o rapaz. Seus olhos estavam fechados, e seu rosto voltado para cima. A voz do homem lhe trouxera alguns flashes de memórias um tanto perturbadores. Em cada um deles, havia sempre um denominador comum; sangue. E nas mãos do rapaz. O rapaz podia sentir uma presença atrás de si, mas não ousava tirar sua atenção das cenas que via em sua mente. Dezenas delas, de todos os tipos. Sangue escorrendo por suas mãos, tubos de laboratório com corpos dentro, uma pessoa que queria ter perto, mas parecia se afastar cada vez mais; mortes para todos os lados; sangue, sangue e mais sangue. Todo ele em suas mãos. Seu passado era manchado de vermelho. O homem atrás de si deu alguns passos lentos para frente, exalando uma risada abafada que podia ser ouvida mesmo distraído. O rapaz sentiu quando o homem repousou sua mão sob a cadeira de rodas, mas ainda assim, não ousou olhar para trás. Sua feição mudou, exalando a culpa que sentia. De repente, todo aquele cansaço agora parecia mais familiar, compreensível .

- Seus mãos… parecem com as minhas. Hmhmhahah.. - Disse o homem, com sua risada familiar.

Por trás do olhar culpado, o garoto começou a recobrar as memórias de sua infância; os dias em que cumpriu as ordens do mesmo homem que estava atrás de si, os dias que andou sob sua tutela, como um filho obediente; os dias que viveu no orfanato do mesmo, servindo como uma marionete aos propósitos desumanos daquela serpente. Lembrou-se de sua amiga, que foi a única pessoa naquela época à lhe demonstrar afeto, a lhe entender. Já não suportava olhar para suas próprias mãos; estavam sujas demais. Seus olhos pareciam pesados; queria fechá-los para sempre, mas sabia que isso estava fora de seu alcance. Um homem não pode morrer duas vezes no mesmo dia. Toda sua infância, todos seus crimes, toda a matança, todos os atos repugnantes que cometeu em nome de Masamune agora corriam como um filme diante de seus olhos.

- Está vendo agora, como somos parecidos… Squall?. - Disse, quase sussurrando a parte final.

- Masa...mune?

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Squall; a última palavra que saiu quase como um sussurro da boca daquele homem foi o gatilho que começou outra sequência de flashes e memórias na mente do rapaz. O dia em que deixou o orfanato, e foi mandado para a Folha, a fim de ingressar na academia; o dia em que saiu de lá formado como um Genin, um shinobi iniciante. O momento em que realizou sua primeira missão - por mais estúpido que parecesse -, que foi pintar uma basílica. O dia em que enfrentou seu primeiro inimigo em um campo de batalha, o pouco de medo que sentiu neste dia; o dia em que conheceu seu antigo colega de equipe e sua sensei, Angell. O dia em que treinaram juntos pela primeira vez; o dia em que o homem de cabelo azuis, Shion, treinou ele e seu parceiro de time; o dia em que saíram para a Prova Chunin, todos juntos. Foi neste dia em que viu alguns de seus companheiros morrerem ao seu lado, pela primeira vez. Primeira vez que lembrasse, pelo menos. Viu um examinador morrendo para salvar todos eles, por conta de sua fraqueza diante de um inimigo. Foi o dia em que Shion foi oficialmente anunciado morto. Aquela coisa que enfrentaram; Korra, lembrava bem dela. Acabou por encontrar e lutar novamente com ela quando foi atacado, na Folha. Todos seus momentos como um Shinobi corriam diante de seus olhos; sua viagem até o Redemoinho, a missão dada por alguém que tinha a parência de Shion para governar e cuidar daquela Vila; sua ascensão ao cargo de Mizukage; o pleito para resgatar Shion na Areia, e o momento em que foi pateticamente derrotado em combate, sendo largado nas águas para morrer e afundar, esquecido para sempre. Lembrou-se de alguém que o chamou de amigo, de alguém que lutou ao seu lado, que quase deu sua vida para proteger Squall, que he fez um pedido instantes antes de Squall o deixar, acreditando que se recuperaria, mas sendo aquilo que, de fato, o enviaria para uma morte prematura. Date, o samurai do País do Ferro.

- Seus mãos… parecem com as minhas. Hmhmhahah.. - Disse o homem, com sua risada familiar.

Por trás do olhar culpado, o garoto começou a recobrar as memórias de sua infância; os dias em que cumpriu as ordens do mesmo homem que estava atrás de si, os dias que andou sob sua tutela, como um filho obediente; os dias que viveu no orfanato do mesmo, servindo como uma marionete aos propósitos desumanos daquela serpente. Lembrou-se de sua amiga, que foi a única pessoa naquela época à lhe demonstrar afeto, a lhe entender. Já não suportava olhar para suas próprias mãos; estavam sujas demais. Seus olhos pareciam pesados; queria fechá-los para sempre, mas sabia que isso estava fora de seu alcance. Um homem não pode morrer duas vezes no mesmo dia. Toda sua infância, todos seus crimes, toda a matança, todos os atos repugnantes que cometeu em nome de Masamune agora corriam como um filme diante de seus olhos. Mas então… porquê? Porque ainda estava vivo? Porque ainda estava aqui? Porque não foi deixado para ser levado pela correnteza e sumir para sempre? Como se estive lendo a mente do garoto, conhecendo sua maneira de pensar, o outro respondeu.

- Parece que nem a morte quer você, meu garoto. A fraqueza tem um preço alto.. - Disse, ainda parado ao lado de Squall..

As palavras foram o bastante para fazer o rapaz cerrar seus punhos, irritado e frustrado; sabia que sua fraqueza e incapacidade fora a causa de tudo aquilo. Lembrou-se da técnica colossal que seu antigo colega de time usara para proteger à ele e outros, quando o próprio Squall estava à beira da morte mais uma vez. Era tão patético que irritava. O quanto ele havia ficado para trás? De fato, havia sido superado. Seus olhos brilhavam, queimavam em ardor e desejo por poder; poder que ele estava ainda longe de ter. O homem reagiu abrindo um sorriso, e largando uma gargalhada em seguida.

- É este olhar… que eu queria..

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Toda sua incapacidade e fraqueza passava bem diante de seus olhos; ao mesmo tempo, seus crimes e atos do passado também. Por toda sua vida assistiu camaradas morrerem, enterrou amigos e companheiros, e sempre esteve um passo atrás de todos. E as últimas lembranças que faltavam comprovaram isso. A pessoa por quem ele acabou se afeiçoando e criando um laço no passado estava perdida mundo à fora, e tudo por conta dele ter sido incapaz de cumprir sua promessa. Sua feição mudou, mais uma vez, e seus punhos se cerraram. Embora carregado de emoções que já nem sabia mais distinguir, agora lembrava. De tudo. Todas as memórias voltaram. E aquele estranho, mas familiar cansaço, agora era mais compreensível. Os momentos que passou no que parecia ser um sonho à beira da morte, não eram sonho. Era sua ida e volta da porta do inferno. E esse homem que estava atrás dele fora o responsável por não deixá-lo terminar a travessia.

- O que você quer de mim? - Questionou com tom e volume de voz agressivos, quase gritando.
- Hmhmhahaha… eu preciso de você, criança. Você… é a chave.. - Disse aquele homem, com seu sorriso no rosto, sendo isso impresso até na maneira que falava, enquanto se afastava aos poucos.
- Volte aqui! - Squall demandou, quase gritando.
- Não se preocupe, garoto. Agora que você está de volta ao jogo, sei que nos veremos em breve.. - Falou, desaparecendo por completo em meio à noite.

Agora sozinho, não restava mais nada além da escuridão da noite para reforçar sua situação. O próximo passo, agora, era sair daquela cadeira de rodas. E para isso, já estava pronto. Apesar de cansado, sabia que ainda havia um motivo para lutar, e precisava continuar. Não poderia se permitir desistir ou parar até encontrar ela. Foi Shion quem lhe ensinou isso.

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