Seyse costumava pensar, quando criança, sobre as batalhas sangrentas que precisaria travar quando um dia se tornasse uma kunoichi, ao lado de tantos outros ninjas de sua idade, todos preparados para confrontar a morte com punhos e dentes. Aldeias gananciosas cobiçando conquistas militares, Nukenin sedentos por glória ou vingança e até mesmo criaturas descontroladas a solta, por vezes denominadas “bestas com cauda”.

”Mas aqui estou, limpando o piso imundo de uma biblioteca”

Apesar de ser uma quebra relativa de expectativas, a Uchiha não estava decepcionada. Muito pelo contrário, estava aliviada. Não era questão de covardia ou indisposição, apenas sentia que não estava preparada o suficiente. Ninguém luta uma batalha que seja incapaz de vencer. Mas não queria permanecer fraca por muito tempo, desejava muito mais que apenas serviços domésticos. Dispensou os pensamentos por alguns instantes e focou no desenrolar de suas atividades, esfregando o piso com o máximo de força que conseguia.

O suor descia por sua testa, estava realizando a faxina desde o amanhecer. Seyse desejava finalizar o mais rápido possível, para que pudesse aproveitar o restante do dia. Não sentia muita vontade de ler os pergaminhos que estavam a sua disposição, além de ser extremamente desinteressada, quando focava em uma atividade não sentia prazer em fazer qualquer outra. Deslizou o esfregão por cada centímetro das imediações que estavam ao seu alcance, mas o tamanho da biblioteca era considerável, superior a qualquer casa que um dia tivesse sido limpa por suas mãos.

As horas de limpeza pouco fizeram efeito para si, o cansaço não afetava-lhe como normalmente deveria, provavelmente por conta de seu treino anterior, ou por já estar acostumada com atividades domésticas. Desde o falecimento de sua mãe, cuidar do lar foi a sua prioridade até que o seu pai acompanhasse a sua matriarca ao túmulo. Era irônico, tudo que fazia poderia ser resumido em ocupar as lacunas de sua vida. Trilhou primeiro os caminhos da mãe, e estava rumando os de seu pai, mas quando que haveria de trilhar o próprio caminho? Seyse não sabe, Seyse não sabe de nada.

O inverno impedia que o calor pudesse afetar negativamente as suas atividades após horas de limpeza. Mas se a temperatura fosse um pouco mais alta, cogitaria aproveitar o movimento escasso para despir-se de sua camisa. Não era o tipo exibicionista, mas quando sentia privacidade optava pela opção mais confortável. Qualquer indivíduo que deteste sujeira poderia concordar que usar vestes imundas pelo suor era consideravelmente desagradável, principalmente considerando que precisaria delas pelo restante do dia.

Quando encerrou a limpeza de todos os andares da biblioteca, iniciou a atividade que talvez seria a mais dispendiosa: limpar os pergaminhos empoeirados. Com o auxílio de um pano levemente umedecido, o suficiente para a limpeza e evitando danificar qualquer um dos textos envolvidos, Seyse limpou as estantes e espanou a poeira acumulada. Caso fosse estudiosa, sentiria encanto pela quantidade absurda de informação que alí estava armazenada, registros de décadas, séculos, talvez milênios se pudesse procurar melhor. Mas, para si, pouco importava quantos anos cada um possuía ou o que estava escrito. O simples fato de se imaginar lendo qualquer coisa que fosse, trazia um tédio tão profundo que poderia fazê-la bocejar.

Seyse recordou a si mesma que gostava de ler, quando criança. Romances, comédias e livros supérfluos diversos. Nunca foi dedicada aos estudos ou conhecimentos realmente úteis que normalmente os mais focados apreciaram. Enquanto limpava a seção de ficções, a nostalgia invadiu o seu peito e tomou conta de sua alma. Mas, mesmo assim, não leu nada. O sabor da infância era sempre agradável ao paladar, mas Seyse não era mais uma criança. Era uma mulher adulta, uma Genin excessivamente madura para os padrões de idade comumente vistos. Talvez um dia, caso houvesse inspiração o suficiente, desse uma lida em alguns textos para relembrar os seus dias dourados. A Primavera não estava tão distante, e quando as flores desabrocham e o sol torna a sorrir entusiasmado, todo sonho ou manifestação de satisfação valem a pena.

Quando Seyse encerrou suas atividades, estava exausta. Sentou-se e limpou a face com um pedaço de tecido qualquer que tinha em mãos, provavelmente a própria camisa. Estava tudo acabado. Decidiu que realmente não queria fazer tais atividades para sempre, por mais que fosse a sua zona de conforto. O quanto antes pudesse fazer atividades de uma kunoichi de verdade, conseguiria sentir afeição pelo Mundo Ninja. Após um breve descanso, decidiu partir em buscar de mais alguma coisa que pudesse fazer.

Considerações:

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