Já havia anoitecido à algumas horas, e pouco tempo antes, Squall havia se livrado de sua paralisia com o uso de uma técnica especial; paralisia esta que era fruto de uma falha grave em combate; fruto de sua fraqueza. A calada e silenciosa noite foi interrompida por um som bestial que vinha ali mesmo, de dentro de sua casa. Com a mão sob sua Kusanagi, tratou de vasculhar a mesma atrás do que poderia ser. Ao chegar aos fundo da casa, se deparou com a resposta; uma criatura monstruosa jazia ali; antes de qualquer reação, o rapaz percebeu que ela não demonstrava agressividade ou intenções de luta. Deixou cair de si um pequeno pergaminho, e assim que o Jounin bateu os olhos sob o papiro deste, um calafrio correu por sua espinha.

”Serpentes gêmeas?” - Pensou, lembrando do símbolo do orfanato de sua inância.

Leu seu conteúdo, entendendo a demanda. E por mais errado que fosse, sabia que uma parte sua desejava ir. A parte que ainda era profundamente sedenta por poder e força. Sem demora, tratou de guardar sua Kusanagi na bainha que carregava nas costas, e então deixar sua residência e ir em direção ao Farol fora do Vilarejo.

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Sob a luz do luar e das estrelas que cobriam o céu noturno do Redemoinho o rapaz seguia freneticamente pela criatura que trilhava mais à frente. Não havia ideia do que esperar, mas sabendo de quem se tratava aquilo tudo, tinha a plena convicção de que precisava estar pronto para tudo. Aquele homem - se é que podia ser chamado assim - era mais astuto e ardiloso que uma serpente. Foi longe ao ponto de fazer alguém implantar bombas na vila toda. E mesmo não sendo o Kage da vila mais; mesmo sequer sendo natural dali, ainda era um Shinobi. Não tinha a opção de deixar tudo às traças. Especialmente se tratando daquele homem e de seu passado sangrento. Atravessou a distância que separava o centro do Redemoinho até o local do encontro, o antigo Farol. Ao chegar, teve uma surpresa ao encontrar não uma pessoa, mas dez crianças mascaradas e trajadas como verdadeiros ninjas.

- Uma armadilha ein? - Falou, quando viu a figura sinistra surgindo do meio das árvores.

O homem citou o nome do rapaz, e falou sobre uma técnica estranha, que parecia estar conectada àquela criatura que havia o guiado até ali. O fato de Muramassa ter enviado alguém unicamente para lhe ensinar uma técnica parecia um tanto… estranho.

- Não sei quem são vocês… mas dúvido que aquele homem iria tão longe à ponto de colocar bombas no vilarejo só para poder me ensinar uma técnica. O que vocês querem aqui?

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A estranha figura que surgiu em meio àquelas crianças demonstrava uma certa familiaridade com Squall, apesar do Jounin não ter a mínima ideia de quem aquilo poderia ser. Nem sequer parecia humano, na grande realidade. E ele insistia em chamar Muramassa de pai; uma prática comum entre as crianças que ele manipulava e usava. Sentindo-se desafiado pelas palavras do rapaz, a criatura demandou uma detonação no Redemoinho; o feixe de luz da explosão era visível mesmo ali, distante da vila. O som da explosão também era audível, visto que provavelmente era grande o bastante para afetar pelo menos uma ou duas casas. O olhar de Squall se fechou mais um pouco; não era grande surpresa. Se esse cara era um dos averbados de Muramassa, Squall já esperava coisas muito piores.

- Quem é você? E de onde me conhece? - Questionou, antes da criatura se aproximar.

O rapaz observou friamente, aguardando que o homem se aproximasse o bastante. Quando ele abriu seus braços, bem próximo do Jounin, o mesmo carregou sua mão direita com o Raikiri, e já bem próximo do outro, mirou um golpe direto em seu peito, visando atravessá-lo.

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A carga elétrica se intensificava ao passo que a raiva do rapaz aumentava; os raios já ressoavam ao redor dele, iluminando o local escuro, causando um ambiente macabro; mais do que já era. E quando achou que tinha pego seu alvo, foi surpreendido. Uma das crianças no local havia se jogado na frente para proteger aquela aberração, ao custo de sua própria vida. O pulso elétrico atravessou facilmente o peito daquela criança, rasgando-lhe o coração em frações de segundos, jorrando sangue para todo lado. E mais uma vez… a trilha de sangue do rapaz aumentava. Por trás do garoto aquele homem disparou um soco que arrancou o braço de Squall de dentro do peito do garoto e o jogou para trás, seguido de uma rápida porém forte sequência de golpes que sequer davam tempo para o rapaz reagir ou pensar. Quando finalmente o último golpe foi dado, o Jounin foi lançado ao chão. Não moveu um músculo sequer; não tentou levantar, nem reagir. Havia um fato que estava lhe incomodando demais para isso. As palavras daquele homem correram diante de seus olhos como um filme; as lembranças eram nítidas demais. A sensação do sangue daquela criança em suas mãos lhe fazia lembrar de tudo que fizera em seu passado. De quem ele era. Ou ainda é, pelo jeito. Lembrou-se das palavras que ouviu um renegado falar, certa vez.

”Eu tentei, tentei mesmo. Mas não dá. Eu não sou um pai de família, não sou aquele bom vizinho, nem um cara legal. Eu sou um cortador de gargantas. Eu sou um assassino.” - Citou a frase do homem mentalmente.

Parecia que o destino reservava ciclos e repetições das quais não se podiam fugir. O rapaz permaneceu imóvel, de olhos fechados, enquanto ouvia tudo que aquela criatura tinha à falar sobre Rinoa também. Absorveu cada palavra em silêncio, guardando-as consigo. O passado era um demônio difícil de ser vencido. E quiçá impossível de o ser. Ouviu a proposta e o homem preparando-se para partir, e então, lentamente, se colocou de pé novamente, e após algum tempo em silêncio, fazendo o outro acreditar que ele recusaria a oferta, ainda incomodado por aquele fato anterior, ele se pronunciou.

- … espere. - Foi tudo que conseguiu falar.

Apesar de tudo, desde o começo daquela conversa, ainda havia algo o incomodando, mesmo quando o assunto alcançou Rinoa. No fundo, por mais que odiasse.

Squall sabia que era tudo verdade.

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A escura noite estava para ficar mais escura ainda. Reunindo a força que teve para pedir que aquele homem parasse, o rapaz se colocou de pé, encarando-o. Tinha uma escolha para fazer, e a fez. E certamente isso faria a tão grande trilha de sangue aumentar. Mas, se para alcançar força e poder, se para se tornar capaz de cumprir sua promessa à pessoa que ama, para poder proteger as pessoas que ama e tem como queridas, para proteger o lugar que o acolheu e recebeu como casa, para ter a força para enfrentar bestas e criaturas que se assemelhavam à deuses, para poder resgatar um amigo, para não mais ser deixado para trás, se para tudo isso havia um preço, se para tudo isso o rapaz precisasse deixar para trás à si mesmo, pelo bem dos outros, ele o faria. Aumentaria quantos kilômetros precisasse a dita trilha de sangue, e faria o que fosse preciso. Assim que observou a técnica em questão ser posta em prática diante de seus olhos, observou fria e silenciosamente. No fim das contas, aquilo não era surpresa. Viu Muramassa fazer aquela mesma técnica tantas vezes quando era jovem, que sabia letra por letra de seu processo. Precisava admitir, era nostálgico, por mais que isso o fizesse sentir culpado.

”Eu tentei, tentei mesmo. Mas não dá. Eu não sou um pai de família, não sou aquele bom vizinho, nem um cara legal. Eu sou um cortador de gargantas. Eu sou um assassino.” - Repetiu as palavras do conhecido renegado outra vez em sua mente, conforme colocara suas mãos sobre a criança que estava à sua frente.

Fechou seus olhos por um instante, antes de continuar, e recorreu às suas lembranças. O sangue quente molhava suas mãos e braços, escorrendo até o cotovelo, onde empoçava e escorria para o chão. Em sua memória, a massa que se formou absorvia o corpo da pessoa tocada por ela por inteiro; uma criança inocente, sequestrada e usada para os propósitos doentios daquele homem. De olhos abertos, colocou sua mão sobre a cabeça da criança. Seu olhar estava fechado, frio, como sempre. Fez como lembrava; expeliu seu chakra, e formou aquela massa, conduzindo-a pelo corpo da criança, transformando suas células e seu corpo em algo pegajoso, como o ritual mandava.

”Rinoa… me desculpe.” - Pensou, terminando o ritual.
- … está feito.. - Falou, sem sequer olhar nos olhos daquela criatura.

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O infeliz parecia determinado em fazer o rapaz adentrar sua escuridão. E por mais que ele tentasse, apenas perdia seu tempo. Squall já não ligava para os meios - pelo menos não naquele momento. Suas mãos ensanguentadas carregavam vidas demais, isso já havia deixado de ser algo que o incomodava tanto. Estava disposto à assumir sua escuridão, abraçar seu lado sombrio, se tornar uma pessoa desprezível, para alcançar o poder necessário para proteger as pessoas à sua volta, para nunca mais ser uma falha, nunca mais ser alguém fraco novamente. Respirou fundo por alguns instantes, se preparando para o que viria. Outra criança parou em sua frente, e antes de recomeçar o processo do ritual, o garoto murmurou um pouco de sua história. Como qualquer criança que veio daquele orfanato, uma vida ferrada, em resumo. O garoto questionou Squall sobre o porquê do que ele fez. Nem ele próprio lembrava de toda a matança que realizou quando era jovem. A capacidade de manipulação de Muramassa era incrível, mesmo agora. Ele suspirou, cansado. Mas por mais cansado de tudo aquilo que ele estivesse, estava mais cansado de ser fraco. Colocou sua mãos sobre a cabeça da criança outra vez, e ficou por alguns segundos em silêncio, com o olhar vazio e distante, escondendo tristeza de uma forma que só ele sabia esconder.

-… sinto muito. - Falou, recomeçando o processo do ritual.

Tratou de condesanr seu chakra naquela massa estranha que deixou o corpo dele, buscando o que pudesse tragar. A massa se grudou ao corpo da criança, engolindo-a por inteiro em poucos instantes; a massa se fundiu ao corpo da mesma, desfazendo seus tecidos corporais, invadindo cada célula de seu corpo, e fazendo sua estrutura molecular por inteira mutar sua forma e se tornar a mesma coisa que aquela massa era, se combinando, e fazendo a criança deixar de existir, sendo agora só mais um pedaço nojento e estranho daquela massa viva de chakra. A mesma veio para o corpo do rapaz, se fundindo à ele, e em seguida foi expelida em forma de um pequeno animal grotesco. Squall levantou seus olhos, com o olhar vazio e fechado, distante.

”Me desculpem… todos vocês.” - Pensou, lembrando da época do orfanato. ”Essa trilha de sangue vai acabar… eu prometo.”

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Aquela estranha coisa, que agora queria agir como se fosse um mentor para o jounin, não cansava de exalar seu sadismo. Era uma clara e nítida maneira de expressar sua raiva contra o rapaz, por qualquer que fosse o motivo. Seu próprio modo de executar vingança contra alguém que odiava; brincar com sua mente. Se divertia, e isso era claro em sua expressão, que aparentava grande prazer em ver Squall abraçar seu lado sombrio por uma busca por poder. Mas, nem sempre o exterior reflete o que há no interior. Diferente do que aquela criatura ponderava, o Jounin sabia que estava fazendo um favor àquelas crianças. Ele próprio foi um fantoche de Muramasa no passado, e sabia de todo o mal que causou, todo o sofrimento que suportou, e todas as coisas que realizou em nome dele. À certa altura da vida, preferia estar morto à ter feito tudo aquilo, à ter passado por todas as coisas que foi obrigado a passar. Morrer em sua inocência era de longe o melhor destino para aquelas crianças, pois, por mais que já tivessem sofrido, coisas cada vez piores aguardavam elas na escuridão da sombra de Muramasa. A pequena criança que foi colocada à sua frente parecia não ter nem um ano de vida completo. Os olhos de Squall se apertaram, seu peito doeu por um momento, mas sabia o que precisava fazer. Outra vez condensou e liberou aquele chakra massivo, em forma de uma massa absortiva, capaz de drenar o que tocasse. A massa cobriu fácil e rapidamente o corpo da pequena criancinha de colo, engolfando seu corpo. Executou todo seu processo; misturou-se ao DNA da mesma, matando cada núcleo de célula e assumindo o controle das mitocôndrias presentes na mesma, assumindo o controle de suas consciências, modificando seu funcionamento e estado, transformando o pequeno corpo em um estado quase líquido, massoso. A massa começou a se condensar e materializar, e agregou à si um pequeno pássaro que estava junto deles, absorvendo-o juntamente no processo. Após alguns instantes, aquela massa se formou em outra mistura bizzarra de criaturas, formando uma única.

-… satisfeito? - Falou, expressando desgosto e raiva no tom de voz, incomum para ele.

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A brincadeira daquela monstruosidade estava indo longe demais. Uma tela foi montada no local, e uma pessoa apareceu nela, chamando Squall por seu nome. Mais uma coisa estranha que aparentava conhecer ele. Isso parecia estar virando moda já. O rapaz ouviu quieta e atentamente cada palavra do show montado por aquelas aberrações. Quando o nome de Rinoa e o fato de células de Squall serem usadas vieram à tona, o Jounin cerrou os dois punhos, e chegou ao estopim de sua paciência. Aquele show precisava e iria acabar. Assim que a tela se desligou, ele permaneceu quieto, com o olhar baixo, tentando absorver tudo aquilo. Sabia que estava longe de ser alguém bom, puro, uma boa pessoa. Talvez o fato de não ter sido bem vindo no inferno era por ser pior que o próprio diabo. Abriu suas mãos, como se estivesse se acalmando, e caminhou tranquilamente até chegar na frente da criatura, e aproximou seu punho inocente e vagarosamente do mesmo, sem movimentos bruscos ou exalar qualquer tipo de intenção; mas foi então que seu olhar mudou, e passou a expressar toda a raiva que estava sentindo naquela situação; seu punho se carregou de eletricidade, e raios começaram a correr por todo seu corpo, aumentando cada vez mais a carga e o som que produziam, devida à raiva que o rapaz sentia no momento. Empurrou sua mão na direção do peito daquele ser, tentando atravessá-lo de uma vez, rasgando tudo pelo caminho, visto que estava perto demais para qualquer criança tentar alguma coisa.

- Te vejo no inferno, algum dia. - Falou, caso acertasse o golpe no peito daquela criatura.

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O pulso de Squall atravessou diretamente o peito daquele ser, espargindo seu sangue para todo lado, lavando o braço do rapaz quase que inteiro. Os olhos de Squall ficaram fitos no da criatura, enquanto sua vida se esvaía aos poucos. Não gostava da matança, mas sabia que era necessária. Quando a criatura terminou suas últimas palavras, o rapaz arrancou seu braço de dentro do peito dele, respondendo-o antes que morresse de fato.

- Não me querem lá também, desculpe decepcioná-lo. E da próxima vez que eu ver seu mestre, ele vai junto com você. - Falou, dando as costas para ele.

À sua volta, uma à uma, as crianças caíram, sem fôlego de vida restando. O rosto de Squall, manchado de sangue, abaixou, e seus olhos doeram por um momento.

- Me perdoem. - Clamou, dando as costas para aquele local de uma vez por todas, e fazendo seu caminho na escura noite através da pequena floresta vizinha de seu vilarejo.

No trajeto, tratou de bater o sangue excedente de suas roupas, e tentar se limpar o máximo possível. Sabia que havia dominado uma nova técnica, chegado à um novo nível como Shinobi, mas algo dentro de si gritava; parecia que algo estava incomodando-o em tudo aquilo. Mesmo após ter a certeza de que era aquele caminho que queria, mesmo após ter decidido ir até o fim, parecia que algo em tudo aquilo o alfinetava por dentro.

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No caminho pela floresta, no retorno para o vilarejo, Squall percebeu uma grande comoção, e diversas pessoas formando grupos de buscas, reunindo-se no portão. Procurou aproximar-se de modo discreto, sem chamar a atenção, mas demonstrando que estava ali, até que pudesse entender o que estava acontecendo. Os familiares dos desaparecidos - dos mortos -, estavam reunidos, procurando por seus filhos. Squall suspirou, sabendo da gravidade da situação, e de tudo que havia feito. Agora era tarde para lamentar; o que estava feito estava feito. Deu o suporte dentro de tudo que fosse possível para os familiares e ninjas presentes, e ao que tudo indicava, não haviam trilhas para seguir. Por entre os boatos que ouviu no próximo dia, ficou sabendo sobre o renome do ninja que o atacou fora do Redemoinho, como era conhecido como “herói” ali dentro. Surpreendente, visto tudo que ele estava armando e todo o cenário que forjou para incriminar o Jounin. O que realmente lhe pegou de surpresa e até afetou um pouco foram as reações dos familiares, e as notícias sobre a modificação em toda a cena da luta. Quem quer que fosse o responsável por aquilo, foi rápido. Mergulhado em seus sentimentos; culpa, frustração, cansaço… Squall optou por prosseguir e fazer o que fazia de melhor com aquelas emoções; enterrá-las e esconde-lás lá.

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