Sōra morava no campo, no cume de uma montanha nos arredores do vilarejo, afastado da região mais movimentada da Nuvem. Naquela região afastada do grande centro da vila, dificilmente os mensageiros chegavam para entregar as missões; ao invés disso, enviavam suas aves, falcões mensageiros, para ordenar as missões designadas a ele. Na tarde de mais um dia comum de outono, ele estava em frente a pequena choupana em que vivia com a família atirando algumas armas num alvo pintado em uma tábua de madeira, erguida por um cavalete alguns metros a sua frente. Ao longe avistou o animal que trazia consigo um canudo que, decerto, continha um rolo de pergaminho contendo a missão para a qual ele deveria partir em breve. Poucos segundos depois, aproximando-se rapidamente, o animal de coberto por penas de um cinza opaco repousou sobre a tábua já profundamente talhada pelo corte das lâminas que o menino arremessava, observando com os olhos atentos, passando de um ponto ao outro do rosto coberto de fina pelugem e cicatrizes de Sōra. Sem hesitar, o chunnin da Aldeia da Nuvem caminhou em direção ao pássaro, retirando de suas garras o canudo, reverenciando brevemente o animal antes de retirar o conteúdo do tubo. Ao que o menino puxava com o dedo indicar e o médio o papel grosso enrolado do interior de seu envoltório, o animal voltou a bater suas pesadas asas cinzentas e se colocar pleno voo, de volta ao seu comandante. Na colina, alguns centenas de metros do vilarejo, a mãe de Sōra estendia algumas roupas no varal improvisado quando o garoto partia, alegre, correndo em direção ao grupo que precisaria encontrar para a missão que recebera, munido de suas armas.

A ventania que tomava conta dos arredores do vilarejo se estendia até mesmo ao cume do elevado em que o menino morava, de onde ele partia rapidamente em direção ao vilarejo. Seu corpo pequeno e juvenil se movia pelas encostas até alcançar novamente a região central de Kumo, direcionando-se ao centro de distribuição de missões, um prédio discreto e bem localizado, a poucos metros do gabinete do líder da vila. As instruções do pergaminho eram claras ao dizer que ele, designado a acompanhar um grupo de mineradores através de uma expedição, deveria encontrar os contratantes ali, no mesmo lugar em que eles acionaram os serviços da vila. Ao se aproximar do edifício, já podia visualizar um trio que se mantinha junto da porta de entrada, a esquerda, com algumas bolsas. Um deles era um homem velho, com um chapéu de palha e um macacão sem mangas, verde-musgo. As sobrancelhas eram grossas, unidas na glabela, e formavam uma única linha de pelos no rosto, conferindo a ele uma feição grosseira, e os sulcos em sua pele reafirmavam a avançada idade. Ao seu lado, dois homens adultos que não tinham muito mais do que trinta anos, ambos usando óculos redondos e de lentes grossas, e a incomum coloração de seus cabelos acizentados denunciavam que não só se tratavam de dois irmãos, como algo na expressão dos trios sugeria que poderiam ser netos do homem entre eles. As mochilas e bolsas ficavam no encargo dos mais jovens, enquanto o outro permanecia com os braços para trás, sacudindo uma das pernas, num sinal claro de quem não queria mais esperar.
Caminhando em direção a eles, o menino apresentava-se, num gesto de reverencia contida, notando a expressão de desagrado do velho.
— Olá, senhores. Meu nome é Sōra, fui designado a acompanh...
— Oh, finalmente. Não importa, garoto. Vamos, não temos tempo. — Resmungava, dando as costas aos três mais novos antes mesmo que o chunnin pudesse terminar de se apresentar. Entreolhando-se, um dos netos do homem disparou a correr, que levou o irmão e Sōra a fazerem o mesmo.

Conforme alcançaram o velho, mantiveram o passo apertado do homem durante todo o trajeto até as minas a que o grupo se direcionava. Vez ou outra, ele abria a boca para reclamar do frio relativo a altitude. Os mais jovens não respondiam — pelo contrário, sequer pareciam estar prestando atenção nas palavras dele, deixando que os ventos das montanhas levassem as palavras. Considerando os modos com que se apresentarem e reagiram a sua aproximação, o chunnin de Kumo também preferia se manter em silêncio, deixando-se guiar pelos contratantes do serviço, que certamente já conheciam o destino, afinal, tratava-se de uma rota bastante movimentada, onde a presença de viajantes de toda parte trafegavam em carroças, cavalos ou até mesmo a pé, como eles. Com o avanço da caminhada, ele percebeu que a estrada pela qual seguiam, pouco a pouco, deixava de ser tão movimentada. O solo, que se tornava cada vez mais acidentado, além do caminho que estreitava-se a cada metro, revelava que não devia haver ali nenhum fluxo de viajantes ou qualquer rota relevante, afinal um comboio ou mesmo um viajante montado a cavalo teria dificuldades em seguir pela terra que não tinha sido batida. Sora nem mesmo tinha percebido em que momento passaram a seguir aquela direção -- foi depois de alguma bifurcação, talvez? Não importava, ele iria proteger os mineradores de qualquer forma.
— Er... Vocês tem certeza de que é por esse caminho, né? — Decidiu perguntar, quebrando o silêncio que já passava de um pouco mais de uma hora e meia de caminhada.
— Sim, garoto. Eu tenho uma bússola! Você sabe o que é? — Fez uma pausa, elevando os braços acima da cabeça, como se estivesse inconformado com a pergunta. — Ah, é claro que não sabe... Hoje em dia, vocês jovens não sabem de nada.
— Ei, vovô, calmaê, eu só perguntei pra ter certeza de que estamos no caminho certo...
— Não liga para o meu avô, garoto... — Disse o rapaz que acompanhava-o a esquerda, sussurrando para que o velho não escutasse — Ele é velho, e gosta de reclamar de tud...
— Eu tô ouvindo isso, moleque! — Gritou, irado, voltando a sacudir os braços com o nervosismo.
— Aliás, meu nome é Shiro, o meu irmão aqui se chama Kuro, e o meu avô se chama Juzo. Nós trabalhamos para a família Hanzo, caso já tenha ouvido falar. — Enquanto falava, ele apontava para cada um dos outros, indicando seus nomes, finalmente apresentando o grupo a Sora.
— É um prazer conhecê-los, Shiro. — Disse, mirando o chão a sua frente. O caminho tinha assumido uma curva na encosta de uma montanha, dentre as várias que existiam no País do Relâmpago. A vegetação rasteira se projetava do chão até a encosta, e logo abaixo um precipício se projetava. A altura era tamanha que a névoa que impedia que eles vissem onde a queda iria dar podia ser uma nuvem. — Eu conheço a sua família... Bem, na verdade eu já ouvi falar, eu acho. Mas não sei muito sobre vocês. — A verdade era que o nome Hanzo era a assinatura que luxuosas peças, desde relógios a brincos e colares, levavam. Decerto estavam em busca de minérios preciosos para a confecção das peças de sua marca.
— Nós viemos até esse país depois de ouvir alguns rumores de uma gruta cheia de minerais preciosos, porém, também existem rumores de que a rota que leva até o ponto de extração é muito perigoso, e... Bem, e é mesmo. Veja só esse lugar. — Apontou com um dos braços a direita, na direção do precipício.
— Ei, vejam — O outro irmão, que até então tinha se mantido em silêncio, mirou para cima, não muito distante do ponto em que estavam. — Deve ser o lugar que estamos procurando.
Conforme seguiam, porém, um desagradável cheiro pútrido os invadia as narinas.