Momentos intensos me assolaram. Talvez todo o questionamento acerca do mundo e seus princípios tenha me deixado um tanto alterado, meu humor há tempos não era mais o mesmo. Aquele retiro ao lar dos monges acontecia mensalmente, no entanto, nunca havia ficado tanto tempo na presença daqueles sábios desde que havia sido encaminhado para o meu futuro shinobi. Tudo lá me inspirava paz e calmaria, o silêncio do local sempre dava espaço ao estrondo de minha mente. Aqueles dias passaram lentos e o trabalho introspectivo proposto por Yamanuki era diferente de tudo aquilo que eu já havia vivenciado, mesmo tendo sido criado e orientado por aquele sujeito que hoje mais parecia um amontoado de peles.

Ele me conhecia, e de prontidão quando cheguei ao monastério notou o quão abatido eu estava, mesmo que eu fosse perito em não exteriorizar estes demônios. Certo é que, no tempo em que estive lá seu objetivo único e determinante soava como filosofia, queria que eu entendesse que até mesmo dentro de toda aquela fragilidade interior que guardamos apenas para nós mesmos, existe uma carga positiva ao nosso âmago. Agora, com meus passos lentos me guiando para casa, já distante bons quilômetros do que um dia já fora meu lar, entendo com perfeição suas palavras. Estávamos sentados sobre pedras no meio do riacho no qual tradicionalmente meditávamos, e não estávamos lá com outro intuito. O som das águas fluindo por entre as águas me transportava ao meu eu, e as gotículas gélidas ao respingar em minhas costas me guiavam novamente ao meu local de origem; era como por pesos equivalentes em uma balança. Tudo é desordem até que se organize. -O que te assombra? Apenas um olho entre aberto mirou o senhor ao meu flanco direito, surpreso por suas palavras. Nunca antes eu havia o visto cessar sua concentração para proclamar qualquer tipo de palavras. Respirei fundo restabelecendo a postura antes levemente relaxada. Os olhos voltaram a se trancar como grades. -O mundo e seus caminhos. Ele deveria estar preocupado, e tinha que ceder ao seu ato de interromper uma atividade pessoalmente divina. -Nem tudo que é, me parece ser realmente. Nossa realidade é mutável assim como nossas técnicas. Minha voz cortou o ar como uma lâmina, e silenciou antes de perfurar o alvo. Pude escutar sua respiração tranquila antes da fala. -Mas nem tudo que realmente é, se faz ser. Sadat, existe uma grande diferença entre ser e existir. Eu e você somos, mas quantos não estão aqui apenas pela existência? Incrível a capacidade que tinha em me trazer clareza com pouquíssimas palavras. -Se nem tudo se esforça para o ser, qual o motivo de existirem? Nossos diálogos sempre acabavam virando um jogo intelectual, no intuito de contemplação suprema; isso talvez fosse mais digno até que a própria introspecção. -Essa é uma resposta que só alcançará ao ser por completo, e não por dúvidas. Ele se retirou paciente, e só retornei a vê-lo novamente no jantar.

O destino era rochoso e cinzento, tinha tons e atmosfera depressiva por mais que chamássemos aquilo de lar e fossemos obrigados a protegê-lo. Meus passos de vinda eram muito mais determinados do que os de partida, e o foco em meu olhar demonstrava a transformação que aquela peregrinação espiritual havia me proporcionado.